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    NOTCIA




  17/02/2020





O RASTREADOR BRASILEIRO
 
Rastreador Brasileiro da criação de Oswaldo Aranha Filho
Foto: cedida por Ângela Aranha Coelho ao GARRB
 
Esta é uma história única nas raças de  origem brasileira.  O Rastreador Brasileiro na sua origem, foi uma raça de um único criador e uma meia dúzia de proprietários, mas  logo teve o reconhecimento do Brasil Kennel Club  e, por incrível que pareça, da própria FCI. Raça que conheci de perto e acompanhei seu início, sua curta duração, seu término e em anos mais recentes, seu ressurgimento das cinzas  de um passado que se mostrou esplendoroso, mas não teve futuro, podendo voltar a  ser agora, quase 50 anos depois,  mais uma raça brasileira reconhecida internacionalmente.  Uma história que parece ter saído de um conto de fadas.
Arthur Luiz Gerhart foi o fundador e  primeiro Presidente da SBCCC (Sociedade Brasileira de Criadores de Cães de Caça), com sede no Rio de Janeiro, onde fui  Diretor de Adestramento por muitos anos. Para melhor divulgar a SBCCC,  em 1971,  Arthur Luiz fundou o jornal  O Rastreador.  Arthur era funcionário da Câmara de Vereadores do RJ, e tinha muito envolvimento com políticos da época.  Nosso jornal  foi lançado no dia de uma das nossas monumentais exposições, tradicionalmente realizadas   no Estádio de Remo da Lagoa Rodrigo de Freitas, na cidade do Rio de Janeiro.
 
Oswaldo Aranha filho com Rastreador Brasileiro macho no Estádio de Remo, Lagoa Rodrigo de Freitas, RJ, na VIII Exposição Especializada da SBCCC de 25 de abril de 1971.
Foto: cedida por Ângela Aranha Coelho ao GARRB
 
Nesse primeiro número do jornal O Rastreador, havia uma página inteira falando de uma raça brasileira, que nenhum de nós na SBCCC  conhecíamos a história, que ali no jornal,  estava contada, pelo seu inventor e criador,  Oswaldo Aranha Filho. No dia do lançamento do nosso jornal,  lá estava o dito Oswaldo com  dois dos seus Rastreadores pela guia. Assim, eu, os demais integrantes da SBCCC e o público presente no Estádio de Remo vimos pela primeira vez um cão da raça Rastreador.
 
Oswaldo Aranha filho com Rastreador Brasileiro macho sendo examinado pelo, Dr. João Urbano de Lacerda, veterinário, na época Diretor do Jardim Zoológico do RJ, Diretor da SBCCC. Atrás, de pé e de boina o juiz, caçador e criador de Pointers Ingleses, Jayme Pinheiro de Aguiar, integrante do quadro social da SBCCC.
Foto: cedida por Ângela Aranha Coelho ao GARRB
 
Segundo Oswaldo Aranha Filho, sua intenção era conseguir um cão onceiro para utilizá-lo em suas caçadas pelo interior do Brasil.
Em 1956, Oswaldo soube, que nas vizinhanças de Varginha(MG) havia uma cadela de nome “Lourinha”  com várias características do “Urrador Americano” ou “Veadeiro”, com fortes vestígios do antigo Fox Hound, bem tipada  àqueles que os engenheiros ingleses trouxeram   para o Brasil, quando da construção de nossas estradas de ferro, nas  primeiras décadas do século XX. Oswaldo buscou o proprietário da Lourinha  e ficou surpreso, quando o mineiro, sabendo que ele era filho do ministro getulista Oswaldo Aranha, deu-a de presente ao ilustre interessado. Lourinha veio para a criação de Oswaldo, tornando-se a principal matriz da raça Rastreador.
Entre outros fornecedores de cães à criação de Oswaldo Aranha Filho, está a família Junqueira, de Ribeirão Preto, de onde lhe vieram alguns “Veadeiros Urradores” (Veadeiros Junqueira), mas que não pode continuar com eles na criação, pois eram muitos a nascer com a pelagem amarela, o que, durante a caçada,  poderia confundí-los com a cor da pele das onças  pardas.
Em 15 anos de criação, Oswaldo conseguira animais de talhe médio, ótimos farejadores e valentes na lida  com os “gatões”, em três cores:
 
1) Manchada, parecida com a cor dos Fox Hounds, ingleses e americanos; 2)  Negro-Pardo; um “black and tan” (pernas, peito e focinho marrons);  3) Azulejos; os americanos os chamam de  “bluetick hound”, um cão de fundo branco salpicado de preto e as extremidades marrons. Um verdadeiro “ruão tricolor”.
 
Imagem: Jornal da SBCCC (Julho 1971) 
 
Quero voltar à cidade de Varginha, onde Oswaldo encontrou Lourinha. Quando eu estava nas pesquisas para fazer o meu livro “Fila Brasileiro, Um Presente das Estrelas”, estive em Varginha(MG) visitando a família de José Gomes de Oliveira, já então falecido. Entrevistei seu filho Aluisio  Gomes de Oliveira, nascido e criado naquela região, que me falou de todas as fazendas e fazendeiros da sua vizinhança. Em meio a conversa, eu me referi  à possibilidade de ter havido algum cruzamento dos cães Fox Hounds (“Americanos”) na Fazenda São Domingos, propriedade de Zé Gomes de Oliveira, pois  Aluizio me dissera, que constantemente suas terras eram atravessadas por caçadores e seus “Americanos” em destino ao interior, em busca de onças e veados. Nesse momento eu me reportei ao que Paulo Santos Cruz dizia sobre aqueles  “Cabeçudos” mineiros, que, uma vez achando o rastro, partiam uivando em direção à presa, e o Aluizio me confirmou haver na época em Varginha, o coronel João Urbano,  que criava “Americanos”, a designação caipira dos mestiços que ficaram por boa parte do Brasil depois que os ingleses se foram. Aqueles Filas da fazenda São Domingos (José Gomes de Oliveira, Varginha(MG), fazenda  do Engenho (José Junqueira, o Zezeca do Engenho, e seu enteado Pedro Ribeiro Junqueira de Souza, o Pedrinho do Engenho), tinham essa característica de sair uivando quando achavam o rastro. E aí, eu acabei me convencendo,  que aquele tipo molossoide do  Fila, mantivera aquela marca registrada do “hound”, coisa que nos dias presentes, não existe mais. Mas o  nosso assunto  é o Rastreador Brasileiro”, voltemos aos fatos.
Essa raça, ao que se sabe, criada por uma única pessoa, e exatamente pela importância do “pedigree” desse Oswaldo Aranha Filho, conseguiu, do Brasil Kennel Club, presidido na época por Antonino Barone Forzano, o reconhecimento nacional e, sem a menor dúvida, pelo prestigio do mesmo Barone,  conseguiu ser reconhecida pela FCI nos anos 60.
Enquanto criou seus Rastreadores, Oswaldo os presenteava  para muitos amigos de diversas partes do Brasil, a maioria deles caçadores. Em meados dos anos 70,  Oswaldo Aranha Filho compareceu a uma reunião do Conselho Federal do BKC, realizado no Hotel Gloria, Rio de Janeiro,  e declarou a raça extinta.  Em conversa, Oswaldo me contou,  que seus últimos Rastreadores haviam sido envenenados pela imprudência de um empregado do seu canil, que exagerou na dose de um carrapaticida, e não lhe sobrou nenhum. Para ele, a raça não existia mais.
Muitos anos se passaram e outros interessados se puseram na estrada em busca do resgate dessa raça. Não foi difícil refazê-la, as raças “ingredientes” estavam à disposição, e aí começava uma outra história que eu não tenho mais condições de contar. Como disse  no início, era um conto de fadas. Com a palavra aqueles que, com a obstinação, trabalho e sacrifício, trouxeram a  raça de volta  à  nossa Cinofilia. Era uma vez ...
 
Rio de Janeiro(RJ), sábado, 15 de  fevereiro de 2020 
Paulo Roberto Godinho
 
Este artigo pode ser reproduzido total ou parcialmente desde que citados o autor e a fonte (Cód. Penal, art. 184: Lei 9610/98 art. 5o., VII e NBR 6023, da ABNT).













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